A impresão 3D chegou à moda e promete alterar o modo como tudo é feito e pensado.

Tudo começou no lançamento do último álbum da cantora Lady Gaga, que apresentou-se num armazém no Brooklin, Nova Iorque, vestida com aquilo que defi­niu como o primeiro vestido voador do mundo. O Volantis estava ligado a dois motores que transportaram a cantora ao lon­go de sete metros, uns centímetros acima do chão. O vestido tinha sido desenvolvido pela equipe de Lady Gaga em conjunto com o Studio XO – uma empre­sa que cruza a moda com novas tecnologias e efeitos especiais – e veio confirmar que há definitivamen­te um novo caminho para a indústria da moda, um que alia a tecnologia à inspiração.

Veja:

rs_560x415-131111091255-1024.Lady-Gaga-FlySuit-jmd-111013
“Trata-se da disposição e acumulação de material em secções – camadas – bidimensionais muito finas e sucessi­vas que vão crescendo e formando uma peça de roupa”, diz Francisca Pinto de Oliveira, investigado­ra na área do fabrico digital. “E daí resulta o objeto tridimensional final.”

O primeiro vestido articulado e inteiramente pensado para impressão 3D foi usado, já em 2013, por Dita von Teese. A rainha do burlesco, mode­lo e artista multifacetada deu o corpo à criação do estilista Michael Schmidt – conhecido por ter de­senhado para Lady Gaga um vestido feito de plás­tico a imitar bolas de sabão. O vestido de Dita von Teese foi concebido em colaboração com o arquite­to Francis Bitonti e construído pela Shapeways, ou­tra empresa de impressão 3D, fundada na Holanda e com sede em Nova Iorque. Preto e com uma textu­ra de rede, o vestido exigiu a junção de 17 partes in­dependentes, coladas em três mil pontos de união. A peça foi decorada com 13 mil cristais Swarovski e feita para as medidas de Von Teese. E não se ajusta ao corpo de mais ninguém. A impressão 3D já começou a operar uma peque­na revolução nos processos de fábrica e manufatura de roupa e acessórios, trazendo para o atelier dos esti­listas o trabalho de arquitetos e programadores.

Um objeto produzido em 3D, recorrendo a vários materiais, deixa de ser um protótipo, mera represen­tação do que o cliente pretende, e passa a ser a pe­ça final, pronta a ser comercializada. O designer dei­xa assim de depender da sua habilidade no desenho para dar asas à imaginação nas criações. Mas pas­sa a ter de adquirir competências para usar softwa­res bem mais complicados. O domínio deste tipo de programa abre portas a uma estética mais futurista, que permite passar para o computador os modelos que escapem a uma reprodução simples de papel e caneta. “A mudança requer adaptação”, confirma Francisca. “O designer passa a ser engenheiro têxtil quando está a definir a forma como o material vai ser impresso, vai ser estilista quando modelar o esboço, costureiro quando lida com a forma como as partes do vestido se relacionam entre si – neste caso não há provas! – e tecelão quando imprime.”

E as possibilidades são múltiplas: ao nível do cal­çado, por exemplo, vários sapatos já foram impres­sos na totalidade e existe até a possibilidade de im­primir uma sola personalizada, ou seja, fazer o scan da planta do pé para criar uma espécie de palmilha que garante os apoios necessários para um cliente em particular. Também já existe oferta de joias que podem, ou não, ser impressas em metais precio­sos. Em Portugal, uma equipe de investigadores da Universidade do Minho desenvolveu uma impres­sora que trabalha com pó de ouro puro e o aplica em várias camadas de nanopartículas que definem a cor da joia consoante o padrão em que são coloca­das. Tudo isto com a mesma tecnologia que, além e aquém da moda, serve à medicina para próteses, por exemplo, ou à arquitetura. “Já foram propostas impressões de casas”, diz a especialista.

No entanto, a impressão 3D, por norma, cola ou laser unem as camadas de cerâmica, políme­ros ou resinas, e estes materiais não são conhecidos pela confortabilidade no vestir. “Ainda há um longo caminho a percorrer. As possibilidades que existem não podem chamar-se tecidos no sentido convencional do termo. São mais estruturas flexíveis ou malhas compostas por elementos interligados, produzidos de acordo com as dimensões tridimen­sionais do corpo e que evitam as costuras.” Mas a ciência tem progredido, impulsionada pelas empre­sas com interesse na área, no sentido de criar os te­cidos da próxima geração, ao mesmo tempo que um novo modelo de negócio se desenvolve para a moda, partindo da crescente difusão dos equipamentos de impressão a três dimensões.

Num futuro não muito distante, talvez seja possí­vel fazer o download do ficheiro de um anel para im­primir em casa. “Mas não acredito que a tecnologia substitua o talento”, diz a arquiteta. “Não se trata de substituir o trabalho desenvolvido por um designer ou costureiro, mas antes dar uma nova ferramenta aos estilistas que lhes permite desenvolver o traba­lho de forma diferente.”

interna-nm1142-moda3d-01

 

Fonte: Revista Marie Claire